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No palco, em todo o trabalho de desenvolvimento do ator, da construção da personagem, a IA pode ser uma boa ferramenta. Exemplos:
- Análise e desenvolvimento da Personagem – Ao analisar padrões de diálogo, emoções e relacionamentos, algoritmos de IA podem ajudar os atores a aprofundar os seus papéis e a fazer escolhas sobre as suas interpretações.
- Performance – A IA através, por exemplo, da tecnologia de reconhecimento facial pode analisar expressões faciais e fornecer feedback sobre microexpressões, ajudando os atores a ajustar as suas representações emocionais. O mesmo aplica-se ao desempenho vocal, com a análise de padrões vocais.
- Formação Virtual – Existem plataformas de formação virtual baseadas em IA que podem simular ambientes de ensaio e fornecer orientação interativa para os atores.
- Busca de Perfis para Castings e Audições – Analisando a informação online, as plataformas de casting e audições podem associar atores a papéis adequados com base nos seus perfis, competências e trabalhos anteriores. Para além disso, fornecem ferramentas de gravação e edição automatizada e análises de performance, permitindo que os atores enviem audições de alta qualidade remotamente.
Porém, há todo um mar de questões que se coloca. Sobre direitos autorais, sobre originalidade e criatividade, sobre ética.
O debate sobre as implicações éticas e sociais deste fenómeno é já universal. No mundo artístico, levantam-se questões sobre autoria, criatividade e o papel dos seres humanos no processo criativo, aborda-se a propriedade intelectual, a originalidade de obras criadas por IA e até a possível perda da expressão artística. Não há dúvidas de que a IA abriu novos horizontes para a criatividade e expressão artística. Mas é importante lembrar que esta é apenas uma ferramenta nas mãos dos artistas e deve ser vista como um complemento ao trabalho e imaginação humana. É esta colaboração entre a IA e os artistas que leva a resultados desafiantes e inesperados, enriquecendo a nossa realidade.
ACTO 1 – O debate
Seria um truísmo dizer que a inteligência artificial não é universalmente aceite. Os progressos realizados nos últimos anos e o facto de ser tão acessível levantaram grandes questões em todos os sectores da indústria. De repente, o cenário fictício em que os robots tomam conta de quase todos os empregos humanos parece cada vez mais provável.
Em 2023, Hollywood viveu duas grandes greves que paralisaram a indústria até novembro de 2023: a greve dos argumentistas e a greve dos atores. Uma grande parte do debate centrou-se num tema: a IA. Porque com as tecnologias de chatbots e agora com algoritmos capazes de reproduzir a voz e até a imagem de uma pessoa, as duas profissões aperceberam-se do que está para vir. O que é que impede um estúdio de realizar um filme com o menor número possível de trabalhadores, recorrendo simplesmente à inteligência artificial?
A comunidade teatral americana também apoiou o movimento. Porque muitos vêem a tecnologia a entrar lentamente também nas artes do espetáculo. De facto, nem mesmo os dramaturgos estão imunes à sua presença. Por isso, há quem sublinhe a importância de lutar contra a integração excessiva da tecnologia, que, de qualquer modo, não conseguiria levar o seu sabor humano ao público. Uma máquina não improvisa, não comete erros, faz as coisas da mesma maneira, retirando toda a espontaneidade à arte do teatro. O que leva alguns a dizer que o mundo do palco está a salvo de ser substituído por Ia’s.
Um comediante robô não será capaz de improvisar a partir da reação do público, não será capaz de transmitir uma miríade de emoções distintas numa tirada e um mágico robótico não será capaz de criar uma narrativa para realizar truques.
ACTO 2 – Infiltração
No entanto, apesar dos críticos, a inteligência artificial está a entrar nas artes do espetáculo. Tecnologias como o ChatGPT são agora capazes de reler uma peça, encontrar erros ou áreas a melhorar e sugeri-los ao autor. Os algoritmos são agora capazes de ler rapidamente uma peça, sugerir diferentes efeitos de iluminação e até desenhar um cenário. Já para não falar da possibilidade de atores virtuais que possam também interpretar os textos, de IAs criadoras de imagens que possam projetar diferentes cenários, etc.
Alguns já estão a pensar no teatro do futuro, com a utilização de hologramas, experiências de realidade virtual e criações que colocam o espetador no centro da trama através da interatividade. A Inteligência Artificial pode ser utilizada para informar o público sobre a peça a que vai assistir, adaptar a música à cena, analisar os momentos que funcionam melhor, etc. Para os atores, a inteligência artificial pode tornar-se um tutor informático. Pode ajudá-los a encontrar a forma correta de representar uma cena através da sua análise, ouvir o sotaque e ajudar a corrigi-lo, e até ajudar um encenador a retificar posturas ou intenções dramáticas.
Tudo isto pode ser visto como uma completa distopia ou como possibilidades artísticas melhoradas. Até poderia ser as duas coisas, mas acredita-se que a criatividade humana vai vencer e vê a IA simplesmente como uma forma de se livrar de tarefas aborrecidas e de se concentrar na criação. A ligação humana é demasiado importante na arte, acredita, para desaparecer completamente.
ACTO 3 – Integração
Como resultado, dramaturgos, atores e encenadores não poderão ignorar a IA. Já abriu caminho e até as artes do espetáculo estão a começar a utilizá-la. Por isso, lutar contra ela parece pouco produtivo. Por outro lado, já pode ser um ótimo tema para futuras peças de teatro.
O tema da virtualidade e do que é ou não é conseguido por um algoritmo é um tema que fascina os realizadores que podem jogar com ele. A utilização da inteligência artificial levanta questões sobre a criação, a produção, etc. O tema da relação com avatares e robots capazes de conversar ganha ainda mais significado quando são utilizados duplos.
A questão do lugar da humanidade num mundo digital está constantemente a ser colocada e, ironicamente, o mundo do espetáculo ao vivo poderia muito bem usar a tecnologia para mostrar às pessoas o que está em jogo hoje e no futuro. Claro que, idealmente, a criação permaneceria nas mãos de humanos e não de máquinas; o público prefere geralmente a sensibilidade à frieza de um algoritmo.
(Alexandre Roberge – “A IA no centro das atenções”)
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